________________________________sobreviver é repetir incessantemente uma carta de amor___________________________


Sinestesia da memória




Muito é medida de peso ou de comprimento?
É que tenho tantas saudades. Muitas saudades. Tenho muitas. Muitas saudades.


Digo sempre: tenho muitas saudades, porque tenho. Nunca digo: sinto saudades...Pois, se disser: sinto, de sentir, neste contexto, associo a um conceito abstracto, insensível, sem matéria, sem nome, sem rosto, sem peso, sem corpo, sem identidade. e eu conheço-te tão bem...


Porque tenho saudades, de ter. Do verbo ter. Ter-te. Porque são de saudades que choro, e são elas que me possuem. Que me têm. Percebes? E tenho muito...muitas...tantas.
Saudades. Elas têm peso, são grandes, compridas e distantes... incomensuráveis, pelo que jamais poderia dizer, tão-só: sinto saudades. Porque a saudade tem peso - sinto o peso. sinto-o, é pesado e pesa. Muito. Sabes que mais? estou corcunda.


Não pesa bastante, nem imenso. Não sinto bastante, nem imenso. Percebes? Culpo as leis da física: estou corcunda. Bastante, soa-me a qualquer coisa que fica aquém e imenso remete-me para algo vago, indefinido, inócuo, flutuante, desprovido de gravidade, sem peso. Por isso, repito: muito, e acrescento: tenho saudades. Digo que tenho muitas saudades.
Tuas. Do verbo ter, de te ter e ser tua. Seres minha, de te possuir. Do verbo ter. De muito ter. Saudades, também. Julgo que vou esquecer de mim, sinto muito meu amor.
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