__________________________________________________acidez noctambular____________________________________________

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#Refeição nua, em série.
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Desta vez arranjámos cocaína. Injectem-na na artéria principal! Pode-se-lhe sentir o cheiro frio e agradável no nariz e conseguir depois uma onda de gozo que invade todo o cérebro, estabelecendo as ligações devidas. A cabeça estala em explosões brancas. Dez minutos mais tarde apetece-nos outra injecção... se for preciso atravessa-se a cidade de uma ponta à outra, a pé, para a conseguir. Mas se a tentativa sair frustrada come-se, dorme-se e esquece-se essa necessidade.


É meramente um desejo ditado pelo cérebro, uma necessidade que não está interligada aos sentidos ou corpo, uma necessidade fantasmagórica, ectoplasma rançoso varrido por um velho junky quando tosse e vomita na manhã doentia.


Há uma manhã em que se acorda e se tomam anfetaminas. Fica-se a planar. Polícias de 1890 com bigodes pretos trancam as portas e debruçam-se nas janelas arreganhando as tachas e com cabeças cobertas de emplastros azuis e dourados. Há junkies que atravessam o compartimento entoando a marcha fúnebre de Moslem, levando aos ombros o corpo de Bill Gains, e as marchas deixadas pelas picadas da seringa têm um brilho de um azul-pálido. Detectives esquizofrénicos indigitados para a tarefa metem o nariz no penico.

São as más viagens da cocaína... Sentem-se e descontraiam-se e tomem uma boa injecção. Dia dos defuntos: injectei-me e comi o cerebrozinho de açúcar do meu pequeno Willy. Ele gritou e tive de sair para ir buscar outro. Passei pelo bar onde deram cabo dos miolos do livreiro Jai Lai.(...)
O estudo das máquinas de pensamento ensina-nos mais sobre o cérebro, do que conseguimos aprender por métodos de introspecção. O homem ocidental exterioriza-se sob forma de dispositivos. Já alguma vez se injectou na artéria principal? Produz-se uma reacção directa no cérebro, activando ligações de puro prazer. O prazer da morfina é visceral. Depois de uma injecção ouvimos o que se passa no nosso íntimo. Contudo a cocaína corresponde a uma passagem de electricidade através do cérebro e a necessidade de [vitamina] «C» é unicamente do cérebro e nada tem a ver com o corpo ou sentimentos. O cérebro carregado de «C» é uma máquina mecânica frenética que dispara orgasmos eléctricos de luzes azuis e cor-de-rosa. O prazer da «C» poderia ser sentido por uma máquina de pensamento. O desejo de «C» dura apenas algumas horas, durante o tempo em que os canais de «C» são estimulados. É evidente que o efeito da «C» apenas se poderia produzir por uma corrente eléctrica com a finalidade de activar os canais da «C» ...


Assim, pouco depois os canais desgastam-se tal como as veias e o viciado tem de descobrir outros. Uma veia pode-se sempre apanhar a devido tempo e mediante perita rotação de veias, um junky pode sempre prolongar o prazer se o desgaste não for demasiado. Contudo, as células cerebrais não se renovam uma vez eliminadas, e quando o viciado deixa de dispor de células cerebrais fica numa situação lixada.


Na linha de horizonte destaca-se o panorama de idiotas nus, acocorados em cima de ossos velhos, excrementos e ferro velho. Rodeia-os o silêncio absoluto - têm os centros da fala destruídos - à excepção do ruído das faíscas e da carne macerada a que aplicam eléctrodos ao longo da espinha. No ar, imóvel, paira o cheiro a carne queimada. Um grupo de crianças atou um idiota a um poste de arame farpado, põe-lhe uma fogueira entre as pernas e fica a observar o espectáculo com curiosidade animalesca, até que as chamas lhe lambem as coxas.A carne estremece sob o fogo numa agonia de insecto moribundo.


Como é hábito, estou a entregar-me a devaneios. Debruçando-me sobre conhecimentos mais exactos da electrónica do cérebro, a verdade é que as drogas continuam a ferramenta essencial do interrogador no ataque que faz à identidade pessoal do indivíduo (...) in Alucinações de um drogado de William Burroughs.
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